Etarismo no mercado de trabalho: impactos e estratégias de combate
PUBLICADO POR SEEPIX COMUNICAÇÃO EM 20/05/2024
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 2012 e 2023, o número de profissionais com mais de 40 anos no país passou de 38,6% para 45,1% do total. Mesmo com essa mudança demográfica, muitos trabalhadores acima dos 50 anos ainda enfrentam dificuldades para se manter ou se recolocar no mercado, representando apenas de 3 a 5% dos empregados nas organizações.
Já uma pesquisa com mais de 258 empresas, feita pela Robert Half e pela Labora, apontou que, em 70% das participantes, houve uma contratação muito baixa, ou nenhuma, de pessoas com mais de 50 anos, o que significa apenas 5% das novas admissões. Ainda segundo o estudo, realizado em 2023, o montante de desempregados nessa faixa etária, em 2012, era de 508,9 mil. Hoje, eles já somam quase 1,4 milhão de indivíduos.
No entanto, com o aumento da expectativa de vida dos brasileiros, o envelhecimento da força de trabalho é uma realidade com a qual as companhias terão de lidar. Ainda segundo o IBGE, de 2012 A 2019, a parcela da população com mais de 50 anos saltou de 23% para 28%. Além disso, estimativas indicam que até 2040 seis em cada dez profissionais brasileiros terão mais de 45 anos de idade.
Mesmo diante da evidência desses dados, as organizações parecem ignorar o fato de que a população está envelhecendo e que é preciso se adequar a essa realidade. A ausência de estratégias de recrutamento direcionadas a profissionais 50+ reflete um poderoso viés etário no mercado de trabalho. Afinal, a maioria das empresas subestimam o potencial da experiência, evidenciando estereótipos profundamente enraizados em nossa sociedade.
Assim como o racismo e o sexismo, o etarismo envolve tratamento injusto ou desigual, neste caso com base na idade de uma pessoa. Isso pode incluir recusa em contratar, promover ou fornecer oportunidades de desenvolvimento profissional, bem como a perpetuação de estereótipos negativos associados a diferentes faixas etárias.
Raízes do preconceito etário
Ao menos no âmbito do trabalho, as origens do etarismo estão diretamente ligadas às mudanças sociais e econômicas que ocorreram ao longo do tempo. Em sociedades antigas, onde a expectativa de vida era menor e a força física era uma característica valorizada nos trabalhadores, os mais jovens eram geralmente favorecidos.
Essa concepção ganhou força durante a Revolução Industrial, iniciada na segunda metade do século XVIII, quando houve uma mudança significativa nas demandas do cenário trabalhista, com ênfase na produtividade e na eficiência. Isso levou a uma valorização do vigor físico e da energia juvenil, muitas vezes às custas dos trabalhadores mais velhos, que eram vistos como menos capazes de atender às novas demandas. A mentalidade persistiu e se adaptou às crenças das empresas modernas, em que a velhice passou a ser frequentemente associada à diminuição da capacidade física e mental.
O etarismo também se consolidou no contexto neoliberal em que vivemos, onde é preciso reduzir despesas e maximizar lucros, muitas vezes de forma cruel e desumana. Essa lógica favorece a substituição de trabalhadores experientes e com salários altos por profissionais considerados jovens, que têm um custo menor e são percebidos como flexíveis e mais receptivos às novas tecnologias e formas de trabalho.
Miopia generaliza
Inúmeros são os preconceitos e estereótipos que reforçam o etarismo e contribuem para a discriminação das pessoas com mais de 50 anos no mercado de trabalho. Um deles, conforme já citado, é a percepção de que esses profissionais são menos produtivos, uma vez que, por serem mais velhos, teriam menos energia, capacidade de aprendizado ou resistência física.
Outra falsa suposição é a de que esses indivíduos são menos adaptáveis às novas tecnologias e formas de trabalho, fortalecendo a crença de que são menos capazes de lidar com mudanças. Mas não fica só nisso. Eles ainda são considerados menos criativos e inovadores, pouco ambiciosos e mais propensos a terem problemas de saúde.
Embora essas crenças continuem a influenciar as decisões de contratação, promoção e retenção, os especialistas no assunto nos mostram outro cenário. Estudos recentes comprovaram que os profissionais mais velhos geralmente têm taxas mais baixas de absenteísmo do que seus colegas mais jovens. Isso sugere que eles têm uma melhor saúde geral e são mais propensos a estar presentes e produtivos no trabalho.
Ainda contrariando o senso comum, a maioria desses profissionais demonstra uma notável capacidade de adaptação aos avanços tecnológicos. Eles estão frequentemente comprometidos com o aprendizado contínuo e a atualização de suas habilidades para permanecerem relevantes e indispensáveis em suas funções.
Inconsciente coletivo
Em um mundo em que as políticas ESG (ambiental, social e de governança) atraem um interesse crescente e enfocam a importância da diversidade e inclusão nas empresas, a existência da discriminação baseada na idade no mercado de trabalho parece ser um contrassenso, não é mesmo? Sim e não.
Se formos analisar a questão do etarismo pela perspectiva psicanalítica, em um cenário mais amplo, podemos dizer eu ele vai além de uma questão de preconceito. Ele pode ser influenciado por dinâmicas inconscientes que moldam as condutas e interações dos indivíduos em todas as dinâmicas sociais.
Por exemplo, atitudes etaristas podem surgir como forma de defesa psíquica, por meio da qual uma pessoa projeta suas próprias ansiedades sobre envelhecimento e mortalidade em outros grupos etários.
A psicanálise também destaca os processos de identificação e diferenciação como relevantes para a compreensão do tema. Uma vez que as identidades são construídas em relação aos outros, o etarismo pode surgir quando as pessoas se identificam fortemente com seu próprio grupo etário e veem grupos diversos como diferentes ou até mesmo ameaçadores.
Efeito reverso
O fato é que, independentemente de suas origens, o preconceito baseado na idade pode gerar impactos significativos e negativos para as organizações. Ao discriminar ou subestimar os trabalhadores com mais de 50 anos, as empresas correm o risco de perder profissionais altamente qualificados e experientes, que poderiam contribuir de maneira valiosa para o sucesso da empresa.
O etarismo pode ainda criar um ambiente de trabalho tóxico e desmotivador para os colaboradores mais velhos. Eles podem se sentir desvalorizados e desrespeitados, levando a uma diminuição da produtividade, moral e engajamento no trabalho, o que compromete o clima organizacional e a coesão da equipe.
Por outro lado, profissionais 50+ normalmente possuem décadas de conhecimento acumulado em suas áreas de atuação. Essa experiência pode ser valiosa para a resolução de problemas complexos, tomada de decisões estratégicas e gestão de equipes.
Além disso, a presença desses profissionais nas equipes de trabalho traz uma pluralidade de perspectivas, experiências e habilidades, que se traduz em maior criatividade e inovação na resolução de problemas. Já a perda dessa expertise, por sua vez, pode exigir investimentos adicionais em programas de desenvolvimento de habilidades.
Por fim, empresas que valorizam e respeitam os profissionais mais experientes demonstram um compromisso com a diversidade, inclusão e equidade no local de trabalho. Isso pode melhorar a reputação da organização, atrair talentos de todas as idades e fortalecer o engajamento dos colaboradores.
Iniciativas de inclusão
Neste contexto, a adoção de políticas e estratégias que combatam o etarismo e promovam uma cultura corporativa mais inclusiva e equitativa tornou-se crucial para que as empresas aproveitem o potencial máximo e a experiência de todos os colaboradores.
Um bom caminho para isso é a criação de programas de sensibilização e treinamento, destacando a importância da convivência entre profissionais de todas as idades. É preciso também incentivar a diversidade geracional nas equipes, por meio do reconhecimento e valorização das contribuições únicas dos trabalhadores das mais diferentes faixas etárias.
Outro aspecto indispensável é a necessidade de revisão das políticas de recrutamento e seleção das corporações para impedir qualquer viés etário. Requisitos de idade em anúncios de vagas devem ser removidos, garantindo a implementação de processos de contratação baseados em competências e méritos.
Já as diretrizes de desenvolvimento de carreira e promoção precisam ser transparentes e fundamentadas no desempenho, possibilitando oportunidades iguais de crescimento. É necessário ainda que as empresas estejam abertas ao feedback e dispostas a fazer ajustes nessas políticas e práticas sempre que mudanças forem imprescindíveis.
Combater o etarismo no mercado de trabalho requer um compromisso firme das organizações. Reconhecer e desafiar esses estereótipos de idade pode estimular ambientes de trabalho mais justos, criativos e produtivos, assegurando não só uma cultura organizacional forte e um melhor desempenho geral do negócio.
E você, já parou para pensar sobre isso? Como a sua empresa trata a questão do estarismo no ambiente de trabalho?
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